Em um dos julgamentos mais polêmicos do Acre nos últimos anos, o empresário Tarcísio Araújo, indiciado e denunciado por feminicídio no caso da morte da cantora Nayara Vilela, prestou depoimento nesta sexta-feira, 9, na audiência de instrução realizada de forma virtual no Fórum Criminal de Rio Branco.
Mas, ao invés de encarar todas as perguntas, Tarcísio optou pelo “silêncio seletivo” e se recusou a responder ao Ministério Público do Acre (MPAC), órgão que o acusa diretamente pela morte da artista.
A decisão foi autorizada pelo juiz Alesson Braz, da 2ª Vara do Tribunal do Júri e Auditoria Militar, que acolheu o pedido da defesa para que o réu respondesse apenas às perguntas da própria defesa e do magistrado. A medida revoltou parte da opinião pública e reforçou a tensão no caso, que envolve acusações de abuso psicológico, controle, ameaças e uma tragédia ainda cercada de dúvidas.
Durante o interrogatório, Tarcísio pintou um retrato controverso de sua convivência com Nayara, frequentemente insinuando que a cantora sofria de distúrbios emocionais e que teria encenado crises para chamar sua atenção. “Achei que até a morte dela era só mais uma tentativa de chamar atenção”, declarou o empresário, que ainda completou: “Ela já tinha tentado isso antes. Eu só gravei o vídeo para mostrar à mãe dela.”
A narrativa apresentada por ele inverte o foco do processo. Em vez de responder às acusações de feminicídio, Tarcísio procurou destacar supostas instabilidades da vítima, como crises emocionais, ciúmes e uso de medicamentos. Chegou a afirmar que Nayara se trancou no banheiro com a arma e teria tirado a própria vida. “Ela colocou a arma no peito e atirou. Eu tentei fazer os primeiros socorros”, disse.
Ainda segundo ele, as armas estavam guardadas no closet do casal, fora do alcance de terceiros — o que contraria relatos de que o filho da cantora, uma criança, chegou a ver a arma sobre a cabeceira da cama.
Em um dos trechos mais controversos, ao ser perguntado se teria tentado acalmá-la antes do tiro, Tarcísio respondeu: “Eu a chamava de donzela, mas ela estava transtornada. Foi tudo muito rápido. Não teve espaço para acalmar.”
Além disso, o depoimento foi marcado por declarações sobre a vida pessoal da cantora. Tarcísio relatou episódios da relação com o ex-companheiro dela, problemas financeiros, insinuações sobre a saúde mental de Nayara e alegações de que a mãe dela controlava o uso de medicamentos e decisões clínicas.
Enquanto isso, a acusação sustenta que Tarcísio exercia controle psicológico e emocional sobre Nayara, dificultava suas relações pessoais e profissionais e a mantinha em um ambiente de constante tensão. A denúncia do MPAC, baseada na investigação da Polícia Civil, é clara: trata-se de um feminicídio.
A audiência de instrução encerra a fase de coleta de provas antes da definição de data para julgamento. A defesa sustenta a tese de suicídio, enquanto o MPAC reafirma: Nayara foi morta pelo homem que dizia amá-la.