Puerto Evo (BO) – Um grupo com mais de 100 estudantes brasileiros, matriculados em uma faculdade de Medicina localizada em Puerto Evo — cidade boliviana na fronteira com o município acreano de Plácido de Castro — tem buscado apoio de autoridades para denunciar o que classificam como um possível cenário de negligência acadêmica, favorecimento indevido e coação institucional.
Segundo os relatos, as denúncias teriam como foco principal a disciplina de Bioquímica. Os estudantes apontam que a docente responsável, identificada como Licenciada Mirna Victoria Zabala Poma, não possuiria formação médica, o que, segundo os alunos, comprometeria a qualidade da disciplina. Ainda de acordo com as denúncias, Zabala teria repassado um conteúdo extenso — 20 capítulos de um livro técnico — para uma única avaliação dissertativa, sem ministrar aulas expositivas ou oferecer acompanhamento pedagógico adequado.
Uma estudante brasileira, que preferiu não se identificar, relatou: “Ela supostamente delegava a responsabilidade do conteúdo aos alunos, que eram instruídos a apresentá-lo entre si. Nos sentimos abandonados e isso tem afetado até mesmo nossa saúde mental.”
Em contraste, estudantes da turma matutina, acompanhados por outra docente — supostamente com doutorado na área — teriam recebido orientações mais objetivas e uma prova baseada em apenas sete capítulos, com apoio didático contínuo. A diferença de tratamento teria gerado um movimento de insatisfação entre os alunos da turma da tarde, culminando em um boicote coletivo à avaliação. Conforme os relatos, mais de 100 estudantes se recusaram a realizar a prova, enquanto apenas dez teriam comparecido — supostamente sob pressão.
Há ainda denúncias de que, durante a aplicação da prova, poucos alunos teriam recebido ajuda direta da professora e de membros da administração, como a Dra. Mishelle Mikaela Leon Robles e Judith Claudia. Imagens gravadas por estudantes do lado de fora da sala mostrariam movimentações suspeitas, com as portas fechadas e interações entre docentes e alunos que estariam fazendo a prova. Os registros estariam sendo usados como indício do que os estudantes chamam de “chanchullo”, expressão popular boliviana para designar trapaça ou fraude acadêmica.
Nesse vídeo, os alunos estariam supostamente colando
Além das alegadas irregularidades pedagógicas, os estudantes também relatam ambiente de medo e insegurança institucional. Eles afirmam que, ao tentarem apresentar suas reclamações, seriam recebidos com desprezo ou ameaças veladas. “Sentimo-nos humilhados. Não há abertura para o diálogo, e quando tentamos nos posicionar, ouvimos ameaças de reprovação. É como viver sob um regime autoritário”, desabafa outro estudante.
Entre as reivindicações encaminhadas ao poder público boliviano, os estudantes solicitam a substituição imediata da docente responsável pela disciplina de Bioquímica; a reformulação da gestão administrativa da faculdade, citada nos relatos como supostamente envolvida em práticas de favorecimento e coação; e a intervenção de autoridades educacionais da Bolívia, especialmente das regiões de Pando e Cobija, para garantir isonomia no processo formativo e respeito aos direitos dos estudantes estrangeiros.
A denúncia coletiva foi encaminhada em forma de carta aberta e também apela ao Itamaraty e aos consulados brasileiros para que acompanhem o caso. Os estudantes afirmam que não buscam conflito, mas sim respeito, justiça e condições dignas para a formação médica.
A reportagem tentou contato com a instituição de ensino e com as pessoas citadas nas denúncias, mas até o fechamento deste texto não obteve retorno. O espaço segue aberto para eventuais esclarecimentos.