Copiar uma foto postada em rede social e posteriormente utilizá-la para outros fins, sem o expresso consentimento do titular, tem motivado diversos conflitos relacionados à exposição indevida da imagem alheia. Por se tratar de um bem protegido pela lei, as consequências podem variar como indenização por danos morais, materiais e até a possibilidade de detenção, nos casos de crimes contra a honra.
Além disso, em tempos de hiperconectividade, praticidade em manipular imagens por meio de ferramentas de Inteligência Artificial e da possibilidade do compartilhamento instantâneo com milhares de usuários em redes sociais, criaram um ambiente propício para possíveis lesões envolvendo os direitos à imagem.
Esse tipo de situação não é uma novidade no ordenamento jurídico brasileiro, em 1928 o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu veredito favorável a Maria Leone, Miss Brasil de 1922, que teve uma foto sua utilizada na produção de um filme, sem a sua autorização. Essa é considerada a primeira decisão judicial envolvendo o direito de imagem no país.
Nesse sentido, embora o contexto tecnológico fosse completamente distinto, o núcleo da controvérsia permanece atual e agora em proporções ampliadas devido ao alcance da internet.
Um caso recente aconteceu com o cantor Leonardo, que buscou a Justiça para reparação em razão da divulgação de material publicitário por um frigorífico de Goiás. Em 2020, o frigorífico presenteou o artista com um kit churrasco e como forma de agradecimento, ele postou no Instagram, uma foto mostrando os produtos. Desde então a empresa passou a utilizar a postagem como marketing da marca, sem o consentimento do cantor, o que configura violação ao direito à imagem.
TUTELA DOS DIREITOS DE PERSONALIDADE
Os exemplos apresentados, reforçam a importância da proteção jurídica à imagem. O ordenamento jurídico brasileiro buscou resguardar o indivíduo e garantir a harmonia social, tornando invioláveis o direito à vida privada, a honra e a personalidade das pessoas, conforme texto da Constituição Federal de 1988, que também definiu a cada indivíduo a autonomia sobre a utilização da sua própria identidade visual.
O Código Civil de 2002 trouxe uma inovação, ao dedicar um capítulo específico para tratar dos direitos da personalidade, no qual está inserido o direito à imagem. A sistematização trazida pelo novo Código representou um avanço importante na tutela dos direitos de personalidade.
Como destaca o ex-ministro do STJ, Franciulli Domingos Netto, a importância da imagem decorre do fato de que esta é a própria individualização figurativa de uma pessoa. Ponto que identifica e a distingue dos demais, por esse motivo é conferido ao seu titular todos os meios de defesa contra ataques ou divulgações não autorizadas.
O uso irregular da projeção visual alheia, por vezes extrapola o campo do direito civil e em situações mais graves envolvendo ataques à honra ou a divulgação de conteúdo íntimo, é na legislação penal que se encontram alternativas para reparar, reprimir e punir os responsáveis pelo fato criminoso.
O Código Penal atua como um complemento necessário para a proteção integral do direito à imagem, repelindo situações que causem humilhação, vexame, desrespeito, vergonha, dor ou sofrimento ao seu titular.
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) apesar de não abordar diretamente o direito à imagem, trata como um dado pessoal que está sujeito a aplicação da lei, reforçando o conjunto de normas que protegem os direitos de personalidade.
EXCEÇÕES LEGAIS
Estão previstas no Código Civil, situações em que podem ocorrer exceções ao direito à imagem, visando equilibrar interesse individual e público. São os casos envolvendo o acesso à informação, administração da justiça e a manutenção da ordem pública. Nessas situações, o uso da imagem sem consentimento é permitido para atender a interesses coletivos.
As exceções podem ser aplicadas quando da divulgação de fotografias para identificar suspeitos ou pessoas procuradas pela Justiça. Em ambas as situações, a lei permite a ação sem o consentimento dos indivíduos retratados, pois visa garantir a ordem pública.
A doutrina descreve ainda outra possibilidade que pode afastar a aplicabilidade de indenização por uso indevido da representação visual: é o caso do jornalismo. Tema bastante discutido, devido a linha tênue entre o direito à informação e a violação da vida privada.
Se uma fotografia for inserida no contexto de uma matéria jornalística, em que esteja apenas informando um acontecimento, apurado e noticiado de forma objetiva e sem identificar as pessoas, esse fato não caracteriza dano à imagem.
As fotografias postadas em redes sociais em perfis públicos, são constantemente motivo de dúvida em relação a possibilidade de utilização por terceiros. O correto é que estas também estão protegidas e são garantidos os direitos ao seu titular, ou seja, não significa que possa ser copiada e utilizada para uso comercial.
Nesse caso, o acesso é permitido apenas para visualização e compartilhamento dentro dos limites da rede social, utilizar para outras finalidades pode acarretar indenização e até responsabilidade penal, caso configure ofensa à honra.
MODERNIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO
A facilidade de acesso e o anonimato proporcionados pela internet, induzem a uma falsa sensação de ausência da titularidade da imagem. O ato instantâneo de filmar uma cena do cotidiano e depois postá-la em rede social, pode acarretar um problema jurídico a quem postou.
Um caso que ganhou destaque na imprensa nacional, foi com a passageira Jeniffer de Castro, que se recusou a ceder o assento em um avião, para uma mãe que pretendia ceder aos caprichos do filho. O fato foi filmado e amplamente compartilhado nas redes sociais, Jeniffer entrou com uma ação alegando ter sofrido difamação e injúria.
A lesão ao direito de imagem impõe o desafio de analisar o caso concreto e ponderar equilibradamente sobre a aplicação ou não do direito ao ressarcimento, a fim de não deixar interesse desprotegido e nem tampouco, dano sem seu devido ressarcimento.
O constante avanço tecnológico impõe ao legislador, a necessidade permanente de modernizar a legislação, a fim de enfrentar de forma adequada os novos modelos de violação aos direitos. Em um ambiente digital marcado pela velocidade da comunicação, é exigida a celeridade na resposta judicial, pois a morosidade pode acarretar prejuízos ainda maiores e até tornar a resposta judicial ineficaz, em relação ao reparo a pessoa ofendida.
Pablo Mendes
Acreano, gestor de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), graduado em História e Bacharel em Direito pela UFAC, instituição onde também cursou Jornalismo.